População se despede das nove vítimas da tragédia em caverna no interior de SP

Lágrimas, toque de silêncio, palmas. Essas foram algumas das formas como familiares, amigos e a população batataense homenageou seis das nove vítimas da tragédia na gruta Duas Bocas, em Altinópolis, que foram veladas no Ginásio de Esportes Marinheirão, na entrada de Batatais, a 355 km de São Paulo. Os outros três mortos foram velados nos municípios de Altinópolis, Sales Oliveira e Monte Santo, em Minas Gerais. Dois sobreviventes, de Franca e de Batatais, continuam internados. Outras cinco pessoas que precisaram de atendimento tiveram alta.

O acidente ocorreu no início da madrugada de domingo, 31, quando o grupo com 28 bombeiros civis fazia um treinamento dentro da gruta e houve um desmoronamento. Segundo o Tenente Veneziani, da Defesa Civil Estadual, que participou das buscas na gruta, 18 pessoas conseguiram sair e foram pedir ajuda para o restante do grupo.

(foto: Bombeiros de SP / Divulgação)

“Ao chegar no local, o bombeiro conseguiu socorrer uma pessoa com ferimentos leves. Depois foram nove óbitos. As vítimas foram sendo localizadas aos poucos, ao decorrer do dia, após a escavação e a remoção da terra”, afirmou.

O tenente reforça que foi um trabalho demorado e perigoso, com condições climáticas ruins, que se mantiveram desde a noite de sábado e ao longo do domingo. Segundo ele, havia risco de novos desmoronamentos, mas as equipes trabalharam até o fim com a esperança de que pudesse haver mais alguém vivo.

“O local era de difícil acesso, com mais de meia hora de caminhada até o posto de comando”, lembra. Um helicóptero foi usado para apoio à operação.

O velório coletivo em Batatais, depois de duas horas restrito a familiares, às 10h30, foi aberto à população. Uma celebração ecumênica e mais duas salvas de palmas marcaram o fim do velório, antes dos enterros. Às 15h03, os caixões passaram a ser retirados um a um, sob forte comoção e novos aplausos. Equipes de enfermagem e psicologia prestaram apoio a alguns amigos e familiares das vítimas.

Velório coletivo (foto: redes sociais)

Ao longo do dia, centenas de pessoas passaram para prestar homenagem. Entre os que permaneceram a maior parte do tempo, várias crianças e adolescentes usando macacão ou a camiseta vermelha dos bombeiros civis. Em alguns momentos, emocionados, integrantes do grupo se abraçavam para se ampararem. No final da manhã, eles ficaram perfilados para uma homenagem coletiva às vítimas.

Entre os mortos estão instrutores e outros membros da escola de formação de bombeiro civil. No sábado, 30, durante o dia, antes de irem para o treinamento na caverna, parte da equipe que morreu havia dado aula de formação para crianças que fazem cursos de primeiros socorros na entidade.

Além de atuarem como bombeiros voluntários, a maior parte dos integrantes do grupo tem outras profissões. Os alunos já faziam ensaios para a formatura, que possivelmente ocorreria em dezembro no mesmo ginásio que recebeu o funeral.

A dona de casa Márcia Regina de Souza dos Santos, 47, conta que sua filha, que nesta manhã prestava homenagem a seus instrutores, é aluna da escola de formação de bombeiros. Márcia destaca que a escola foi significativa para aumentar a autoestima da filha e que a adolescente já pôs em prática lições aprendidas com o grupo.

“Em abril, engasguei com frango e já estava perdido o sentido. Consegui bater no ombro do meu marido e falar o nome dela. Ela veio, viu que era um engasgo e (com manobra aprendida no curso) conseguiu reverter”, relata.

O comandante geral de operações dos Bombeiros Unidos sem Fronteiras no Brasil, Bolívar Fundão Filho, participou da homenagem às vítimas. “Conheço todos. São todas a minha equipe”, definiu. “A escola Royal Life marcou um treinamento em resgate em caverna e ofereceu algumas vagas para o nosso pessoal. Na hora em que ruiu a estrutura, os dez nossos ficaram. Um saiu com vida, os outros nove estão aí. Seis aqui e três nas cidades vizinhas”, explicou.

Bolívar destacou que a sub delegacia de Batatais é uma referência para a organização no Brasil e recebe pessoas de outras regiões para treinar. “É a maior tragédia nossa, em um dia só perder nove membros. Perder nove membros fazendo resgate seria uma coisa, perder treinando para salvar é totalmente diferente”, destacou.

Bolívar defendeu o tipo de treinamento que era realizado. “Quem faz resgate deve se preparar para qualquer situação de emergência. Caverna é um lugar confinado. Dependendo da cidade em que eles atuam, são eles a primeira resposta. Nós temos no Brasil mais de 5400 municípios e só 18% têm a presença de bombeiros militares. Então existe uma lacuna, um vácuo muito grande. Nessas cidades em que não há bombeiros militares, a primeira resposta é bombeiro civil”, disse.

Bolívar explicou que essa caverna já era usada para treinamento há quase uma década. “Desastres como esse acontecem em cavernas justamente como essa. Se você não treinar o mais próximo da realidade, como você vai saber agir? Uma série de fatores que infelizmente foram somados e aconteceu essa tragédia”, observou.

O representante destacou que todos atuaram nos grandes incêndios que atingiram a zona rural do município na seca recente. “O próprio Celso, que era o comandante aqui, já salvou várias pessoas”, menciona. O comandante Celso namorava Ana (velada em Sales Oliveira), que estava indo em seu primeiro treinamento. Também eram casal, o Cândido e a professora Elaine.

Presente no velório, o coronel Romanek, coordenador da defesa civil do Estado de São Paulo, relatou que as condições dificultaram o resgate. Foi feito um processo técnico de busca de informações sobre o local, conseguindo um mapa da gruta. Um geólogo integrou a equipe confirmando que era uma gruta seca sem risco de afogamento.

“O local é de difícil acesso, tivemos problemas de comunicação. Fizemos uma rede emergencial com radioamadores que são cadastrados na defesa civil estadual para a gente poder ter comunicação”, afirmou. Esses voluntários viabilizarmos sinais de transmissão por rádio que permitiram a comunicação das equipes no local. Corpo de bombeiros, defesa civil, polícia militar e SAMU integraram as equipes que se mobilizaram para o resgate no domingo, 31.

Nesta segunda-feira, 1º, a prefeitura de Altinópolis interditou o acesso à gruta em que ocorreu o acidente e reforçou que fica em uma propriedade particular, não fazendo parte do circuito turístico do município.

As prefeituras de Altinópolis e Batatais decretaram três dias de luto.

Seis vítimas do desabamento veladas no ginásio de Batatais:

Celso Galina Jr

José Cândido Messias da Silva

Elaine Cristina de Carvalho

Rodrigo Triffoni Calegari

Jonatas Ítalo Lopes

Jenifer Caroline da Silva.

Outras 3 vítimas do desmoronamento:

Natan de Souza Martins, velado em Altinópolis

Ana Carla Costa Rodrigues de Barros, velada em Sales Oliveira

Débora Silva Ferreira, velada em Monte Santo de Minas

 

Agência Estado

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