Brasil com temperaturas cada vez mais altas e chuvas mais extremas nas últimas décadas

Chuvas provocam cheias no Rio Grande do Sul (Daniela Barcellos/Governo do Rio Grande do Sul - Divulgação)

Um estudo do governo federal comprova o aumento constante das temperaturas nos últimos 90 anos e a ocorrência de chuvas cada vez mais extremas no País, especialmente nas últimas décadas. O documento “Normais Climatológicas do Brasil 1991-2020”, do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), órgão responsável pelo monitoramento climático do Brasil, foi obtido pelo Estadão/Broadcast e será divulgado na quarta-feira, 23, pelo órgão ligado ao Ministério da Agricultura.

Normais são médias históricas meteorológicas apuradas em longos períodos e representam as características do clima em um local. O último levantamento compreende o intervalo entre 1º de janeiro de 1991 e 31 de dezembro de 2020, feito em 271 estações do Inmet no País. “A atualização e acompanhamento das normais climatológicas são extremamente importantes para o agronegócio, risco climático de seguros agrícolas, mercado financeiro, setor de geração de energia, entre outros”, informa o Inmet.

Chuva em São Paulo( foto: Agência Brasil)

Um dos maiores municípios do mundo, São Paulo registra também dados mais contundentes das alterações climáticas. Moradores enfrentaram temperaturas mínimas até 2,7 graus Celsius (°C) mais elevadas em alguns meses. Os eventos extremos de chuva excessiva na capital paulista quase duplicaram para temporais de 80 milímetros (mm) e são mais de três vezes maiores para os de 100 mm, cenário que se intensificou desde a década de 1990.

Segundo o Inmet, os resultados de elevação de temperatura podem estar associados à variabilidade natural, ao aquecimento global e à urbanização das cidades. “De todo modo, o fator antropogênico (ação humana) é a causa mais provável das mudanças climáticas”, aponta o órgão. “Os extremos estão superando a resiliência de alguns ecossistemas e sistemas humanos, e desafiando as capacidades de adaptação de outros, incluindo impactos com consequências irreversíveis. Pessoas e sistemas humanos vulneráveis e espécies e ecossistemas sensíveis ao clima estão em maior risco”, completa.

No documento, o Inmet compara os dados obtidos em medições entre os períodos de 1931-1960, 1961-1990, 1981-2010 e de 1991-2020 e, como exemplo, aponta a elevação de temperaturas em metrópoles, pequenos e médios municípios do Brasil. O estudo mostra ainda a alteração do padrão de períodos mais chuvosos e o crescimento de precipitações severas em períodos recentes.

O estudo comprova o aumento gradativo de temperaturas no Brasil ao longo das últimas décadas. O aquecimento ocorre tanto nas temperaturas mínimas, quanto nas médias e nas máximas e em todas as regiões do País, segundo o documento.

Para uma das capitais mais quentes do País, Cuiabá (MT), o Inmet aponta “claramente uma elevação da temperatura mínima quando comparados aos períodos de 1931-1960 com 1991-2020 em todos os meses do ano”. Em outubro, por exemplo, a variação chega a 1,6° grau Celsius (°C) e, nos meses de abril e novembro, a alta na temperatura mínima é de 1,5°C.

A elevação da temperatura mínima em São Paulo, se comparados os períodos de 1931-1960 e 1991-2020, ocorreu em todos os meses do ano e foi de, no mínimo, 1,6°C, com pico de 2,7°C em julho e abril. Ou seja, as madrugadas estão ficando mais quentes em um dos maiores municípios do mundo, segundo o órgão do governo federal.

Em Brasília (DF) cuja medição começou em 1961, um ano após a fundação da capital, o Inmet destaca a alta nas temperaturas médias em todos os meses do ano. A maior mudança é em outubro, cuja elevação é de 1,5°C quando comparados os períodos de 1961-1990 e 1991-2020, passando de uma média de 21,6°C para 23,1°C.

Chuva em BH (foto: Agência Brasil)

Em Belo Horizonte (MG), além do crescimento constante das temperaturas médias, na comparação dos períodos 1931-1960 e 1991-2020 observa-se uma elevação de até 1,7°C de temperatura média nos meses de julho e dezembro, de 1,6°C em junho e de 1,5°C nos meses de abril, maio, agosto e outubro.

Até a capital com o clima mais ameno do País está mais quente, ou menos fria. Em Curitiba (PR), a temperatura média de julho, mês mais frio do ano, foi de 13,8°C no período mais recente, 0,9°C acima da média em relação ao período de 1961-1990, de 12,9°C. O mês que apresentou maior elevação da temperatura média no município paranaense foi dezembro, com 1,4°C, seguido por abril, com elevação de 1,3°C quando comparados aos períodos de 1961-1990 e 1991-2020.

Do lado mais quente do País, no Nordeste, Fortaleza (CE) sofre com aumento das temperaturas máximas em todos os meses. Se comparados os períodos 1961-1990 e 1991-2020, os meses que apresentaram maior elevação foram os de agosto e setembro, 1,2°C.

As chuvas extremas como as que mataram mais de 330 brasileiros desde o final do ano passado estão cada vez mais comuns. O estudo aponta que os efeitos da ação humana e da urbanização no clima fizeram crescer a quantidade de dias de temporais com capacidade potencial para transtornos, aqueles volumes acumulados acima de 80 milímetros (mm) e 100 mm.

Além disso, houve mudança no ciclo em algumas regiões, com a migração entre os meses com maior acumulado de chuvas. Outra constatação é que as chuvas em maior quantidade e com maior potencial de destruição fizeram com que os volumes acumulados na maioria dos meses fosse maior ao longo dos anos. Isso “mascara” o fim de períodos de estiagem, pois, na prática, chove muito em pouco tempo.

Em São Paulo, por exemplo, se comparados os períodos de 1931-1960 e 1991-2020, houve aumento da precipitação acumulada em todos os meses do ano na medição feita no Mirante do Santana, exceto agosto, com pequeno declínio de 6,5 mm. Em março e dezembro ocorreram as maiores elevações acumuladas, com 56,1 mm e 51,1 mm, respectivamente.

A elevação do volume mensal acumulado de chuvas vem das precipitações mais extremas. Na capital paulista, comparando os resultados da última década, entre 2011 e 2020, com o período de 1991-2000, foram menos dias com chuva acima de 50 mm e mais dias com chuva acima de 80 mm e 100 mm, passando de 9 para 16 dias e 2 para 7 dias, respectivamente. “Ou seja, os eventos extremos de chuva excessiva na cidade de São Paulo aumentaram desde o início da década de 1990”, informou o Inmet.

Segundo o instituto, a alteração no padrão de precipitação é mais evidente quando comparadas a última década, de 2011 a 2020, com o período inicial de análise, entre 1961 e 1970. O número de dias com chuva acima de 50 mm aumentou em dez dias, de 37 para 47 dias, enquanto para chuva acima de 80 mm, o aumento foi de 13 dias, de 3 para 16. Não foram observados dias com chuva acima 100 mm na década inicial, já no período de 2011-2020 foram 7 dias.

Nas estações meteorológicas de Belém (PA) e Porto Alegre (RS) o cenário é semelhante. Na capital paraense houve mudanças significativas no número de dias com chuva acima de 50 mm, 80 mm, e 100 mm, desde a década de 1960. Entre as décadas de 1991-2000 e 2011-2020, o número de dias com chuva acima de 50 mm passou de 75 para 110 dias, aumento de 35 dias, o número de dias acima de 80 mm alterou de 15 para 26 dias e, acima de 100 mm, o número ficou praticamente estável, caindo de 8 para 7 dias.

“Assim como em São Paulo, a comparação entre o número de dias com chuva acima de 50 mm, 80 mm e 100 mm entre a década mais recente e o período de 1961-1970 em Belém é impressionante, pois também mostra o aumento de eventos extremos por excesso de chuva. O número de dias com chuva acima de 80 mm, por exemplo, aumentou de 9 para 26 dias e, acima de 100 mm, o aumento foi de 4 dias, passando de 3 para 7 dias”, informa.

Chuva em Porto Alegre (foto divulgação governo RS)

Em Porto Alegre, houve um crescimento de dias com chuva acima de 50 mm, 80 mm e 100 mm se comparadas as duas últimas décadas, de 21, 6 e 2 dias, respectivamente. “A alteração no padrão de precipitação também fica evidente quando comparada a última década com o período inicial de análise (1961-1970). Dias com chuva acima de 50 mm aumentaram de 23 para 56 dias, para chuva acima de 80 mm o aumento foi de 3 dias (5 para 8 dias) e, para número de dias com chuva acima de 100 mm, o padrão é praticamente o mesmo, passando de 1 para 2 dias.”

Chuva em Maceio (foto: Agência Brasil)

Além de chuvas mais severas, o estudo apontou também mudança nos períodos quando as precipitações acumuladas são maiores. Em Maceió (AL), mês mais chuvoso em dois períodos de três décadas – em 1931-1960 e 1961-1990 – foi maio. Porém, desde então, inclusive na atual normal meteorológica 1991-2020, observa-se que o mês mais chuvoso, em média, agora é junho. “Ou seja, houve uma mudança no padrão da chuva na cidade quando comparadas as médias dos últimos 60 anos”, apontou o Inmet.

Em Barcelos (AM), quando comparadas as normais meteorológicas de 1931-1960 e 1961-1990 com a versão mais recente, de 1991-2020, observa-se que o mês mais chuvoso antecipou de maio para abril. Além disso, no quadrimestre mais chuvoso, que corresponde aos meses de fevereiro a maio, a precipitação aumentou, em média 244,5 mm, quando comparados os períodos de 1931-1960 e 1991-2020. Por outro lado, em outubro, a precipitação diminuiu cerca de 21,0 mm quando comparados os mesmos períodos.

 

jornal O Estado de S.Paulo

COMPARTILHAR:

Participe do grupo e receba as principais notícias de Campinas e região na palma da sua mão.

Ao entrar você está ciente e de acordo com os termos de uso e privacidade do WhatsApp.

NOTICIAS RELACIONADAS